Os cuidados a serem observados na elaboração do memorando de entendimentos (MOU)

O presente artigo visa realizar uma análise sobre o documento denominado memorando de entendimentos (MOU) ou protocolo de intenções, e em quais situações ele é capaz de gerar o vínculo jurídico no tráfego negocial, e como tem sido a interpretação dada pelos tribunais brasileiros acerca desta questão.

O memorando de entendimentos ou protocolo de intenções tornou-se muito comum nas negociações de direito privado, notadamente nas de natureza empresarial. Por isso, é fundamental o seu adequado enquadramento jurídico na sua elaboração, seja diretamente para gerar certeza aos interesses das partes, prevenindo dúvidas e controvérsias sobre os seus efeitos jurídicos, seja indiretamente para satisfazer o interesse público, ao evitar litígios entre os negociantes, capazes de gerar custos judiciais para o estado.

Em outras palavras, torna-se recomendável o preenchimento do seu conteúdo de forma adequada, principalmente com a descrição do seu enquadramento jurídico na forma pretendida pelo cliente, a fim de gerar certeza aos interesses das partes e evitar a ocorrência de conflitos.

Constata-se que, se as partes definirem os elementos essenciais do contrato futuro (consentimento, objeto e preço), as partes não estarão mais no campo da fase das tratativas, eis que elas assumirão a efetiva obrigação de celebrar o contrato em momento posterior, pois, ainda que tenham atribuído ao documento a denominação de memorando de entendimentos ou protocolo de intenções, elas terão assumido obrigação vinculante e o documento será compreendido na ordem jurídica como um contrato preliminar.

O vínculo jurídico decorrente do memorando de entendimentos ou protocolo de intenções também poderá ser caracterizado pelo instituto da proposta e sua aceitação, eis que diante da dinâmica gerada no tráfego negocial podem as partes caminharem da fase das negociações preliminares para a formação do vínculo jurídico por meio de usos, comportamentos concludentes ou práticas comerciais, de sorte que encerrará a fase das tratativas e iniciará a fase da formação do contrato pelo consentimento  comum a contratar e pelo delineamento do objeto e do preço contratual, determinado ou determinável.

Desse modo, a existência do memorando de entendimentos e a existência de atos jurídicos praticados pelas partes podem se enquadrar na fase das tratativas como também podem gerar o vínculo contratual entre as partes, por meio do contrato preliminar, na forma do art. 462 do Código Civil, ou da proposta e sua aceitação, na forma dos arts. 427, 431 e 435 do Código Civil, daí a importância do advogado em delinear adequadamente o conteúdo do documento na forma pretendida pelo seu cliente, isto é, definir se o documento é vinculativo ou não.

O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo no julgamento do recurso de apelação cível nº 1090938-64.2013.8.26.0100, de relatoria do Des. Correia Lima (DJe 06/10/2016), interposto em face da sentença proferida na ação de embargos à execução que julgou extinta a ação de execução por falta de título executivo apto a aparelhá-la ajuizada pela empresa compradora, compreendeu que o memorando de entendimentos possui natureza de um contrato preliminar.

O Tribunal de Justiça do Estado do Paraná no julgamento do recurso de apelação nº 1.602.842-9, de relatoria do Des. Robson Marques Cury (DJe 28/06/2017), ao dizer que o memorando de entendimentos para a locação de equipamentos para desenvolvimento de atividades portuárias assinado entre as partes possui natureza de contrato preliminar, capaz de gerar a obrigação de assinatura do contrato principal.

O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, no julgamento do recurso de agravo de instrumento nº 5375332-85.2020.8.09.0000, de relatoria do Des. Marcus da Costa Ferreira (DJe 14/10/2020), entendeu que o memorando de entendimentos formalizado pelas partes caracterizou o vínculo jurídico tanto pelo instituto do contrato preliminar como também pelo instituto da proposta e sua aceitação, em razão de comportamento posterior concludente das partes.

O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que o memorando de entendimentos de acordo com as circunstâncias negociais possui natureza de contrato preliminar, conforme decisão proferida no recurso de agravo em recurso especial nº 1.222.399-SP, de relatoria do Min. Lázaro Guimarães (DJe 08/08/2018), que confirmou o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

Assim, para evitar a ocorrência de interpretações discrepantes entre as partes em relação ao memorando de entendimentos ou protocolo de intenções, recomenda-se que elas descrevam no documento os efeitos da sua caracterização, isto é, se pretendem se inserir tão somente na fase das tratativas, ou se pretendem gerar o vínculo jurídico, por meio do contrato preliminar, como forma de gerar indiscutivelmente os efeitos deste tipo de contrato, ou, ainda, pela proposta e sua aceitação, dando a atribuição de eficácia contratual à totalidade do documento ou apenas a uma ou mais cláusulas contidas nele, caso seja essa a intenção do seu cliente.

Publicado por:

Dr. Maurício Alves de Lima

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